Estava a trabalhar e senti fome. Não tinha comida e saí para a rua com vontade de comprar fruta. (Era verão)
Há uma mercearia mesmo aqui ao lado onde acabei por comprar três peças de fruta.
Enquanto esperava a conta, espreitei os biscoitos.
- Quer levar? São muito bons.
- Não, obrigada. Respondi evasivamente.
- Não quer engordar!? … o seu sorriso com malícia sublinhou “engordar”.
- Não posso comer doces. Desculpei-me com a minha saúde, envergonhada.
- Mas está tão magrinha! Bem pode comer um doce!
Sorri, amarelamente e saí a pensar “Tenho que encontrar outra mercearia aqui perto”.
Usamos os elogios tão poucas vezes. Com os nossos filhos e com os alunos.
Ouvimos dizer, ou lemos algures, que os elogios são o “adubo” da auto-estima. E uma auto-estima forte e bem tratada é fundamental para o sucesso … académico e outros.
Ou talvez não.
O outro lado da moeda é que o elogio pode ser percebido como um estratagema, uma manipulação.
“Ai que menina tão bonita que vai comer a sopa toda”
“Claro que consegues acabar essa ficha. Tu és tão bom a matemática!”
Com estes elogios conseguimos que coma a sopa, que acabe os trabalhos na sala, que se porte bem, que seja uma boa menina.
Com elogios também conseguimos que se sintam inferiores, submissos e dependentes … do próximo elogio.
“Que bem que estás a comer a sopa”
“Já terminaste parte da tua ficha! E tens tudo certo até aqui. Boa!”
A diferença é que aqui apenas reconhecemos o que a criança faz bem, sem esperar que faça nada mais para nos satisfazer.
A diferença é que lhe fazemos sentir que é seu o poder de acabar a sopa e os trabalhos. E isso faz toda a diferença.
Eu recebi um elogio da senhora da mercearia. Devia ter sido bom e no entanto saí da mercearia com a certeza que não vou voltar.
Depois do almoço fui a outra mercearia e comprei um pacote de “cheetos”.
O elogio cria, por vezes, desconfiança, sobretudo, a nível de trabalho de escola. Por um lado, somos competentes, por interesse egoísta da organizacao; por outro, suscitamos inveja mesquinha, sempre à procura das hipotéticas falhas. Eu elogio, tu elogias?